quinta-feira, 30 de agosto de 2012

A QUEDA DE UM GIGANTE

 

1
No dia onze de julho
Fiquei de queixo caído
Vi o senado sem brilho
Vi um homem ser punido
Pálido como uma vela
Demostenes ficou na tela
Como um touro sem mugido.

2
Uma arena quase cheia
Uma assembléia cortês
Com a queda de um acróbata
Que se ferrou de uma vez
Cada um dava-lhe um couro
Sem perdoar o seu choro
Na farra da estupidez.

3
Foi punido pelos votos
E pela ética condenado
Mas pareciam insetos
Quando pousam no melado
Formigas na rapadura
Mostravam a compostura
De estar do outro lado.

4
Na mesa um velho falante
E sua consulta ao plenário
Como o capa mor da casa
Organizou o cenário
Nem sabia o resultado
Daquele quadro pintado
Com um senador hilário.

5
As lideranças falaram
Cada qual do seu jeito
Num tempo já comedido
Insuficiente para o efeito
O papo foi dando voltas
E sem precisar de escoltas
Tudo com muito respeito.

6
Se o decoro foi quebrado
A disciplina é ato sério
Cada discurso um fato
Cada relato um critério
O gigante já suado
Ouviu seu advogado
Cochichar algum mistério.

7
A mentira é um crime
Que afeta a impunidade
O parlamentar se redime
Mas faltou com a verdade
Por isso foi castigado
E sem ser interrogado
Negou a cumplicidade.

8
A cachoeira jorrava
E as cascatas fluíam
Entre lágrimas e suor
Os diabinhos sorriam
Vendo aquela situação
De um homem sem perdão
Até os anjos fugiriam.

9
Todos se sentem blindados
Pimenta nos olhos alheios
Que seja no voto secreto
Um cavalo sem arreio
Os valores são pesares
São águas de outros mares
Uma arena para rodeio.

10
Se da empreiteira Delta
Escorria o sujo dinheiro
E quem banhou-se na fria
Afogou-se por inteiro
Proposta de redenção
Quem quiser que dê a mão
Ficando no atoleiro.

11
O povo ninguém engana
Mas vota no que não presta
Se tudo acaba em pizza
Ignorar é o que nos resta
Uns ficaram constrangidos
Outros foram dirigidos
Para aparar as arestas.

12
A defesa só cumpriu
O que já se esperava
Falou, falou e não venceu
Pois ninguém acreditava
No discurso solto ao vento
Que se perdeu num momento
Na casa que o julgava.

13
Um julgamento político
Um homem como um réu
Errou feio e se perdeu
Como uma pipa ao léu
E agora paga caro
Como um bicho sem faro
Como mágico sem chapéu.

14
Cai o rei de espadas
Disse na sua defesa
Por isso foi condenado
Improbidade na incerteza
Além de dizer-se honesto
Pedia em seu manifesto
Socorro na correnteza.

15
Se Cristo andou com Judas
Andou por caminho torto
Ou só quería defendê-lo
Tirá-lo daquele entreposto
Mas essa pressão atola
E a cadeira não tem cola
E a deriva não tem porto.

16
Investigado pelos pares
Passando apuros desprezíveis
O projeto de resolução
Os votos são disponíveis
Para calar seu mandato
Demóstenes pagou o pato
Vedado das causas cíveis.

17
Um bode espiatório
Berrando pelo plenário
Jogado ali aos leões
Devorado no ideário
Um dia atrás do outro
Um burrico vira potro
E ouve canto de canário.

18
Me diz: e agora José?
Vossa Excelência está bem
Vossa Excelência votou
Vossa Excelência caiu do trem
Pelo que se vê acabou
A punidade funcionou
Na vingança de alguém.

19
Um Procurador de Justiça
Num rito de um julgamento
Opiniões já formadas
Um passo no regulamento
Se o voto é secreto
Aprova-se o tal projeto
Nas normas do regimento.

20
Um homem que fez de tudo
Pelo povo brasileiro
Fez projetos, criou leis
Ocupando o picadeiro
Agora na corda bamba
Viu o tema virar samba
Na batida do pandeiro.

21
Uma cabeça rolando
Caindo ladeira abaixo
Pela rampa do senado
Banana fora do cacho
Caiu na gordura quente
Fritada qual indigente
No fogo fátuo do tacho.

22
Farinha do mesmo saco
De foro privilegiado
Os delitos são constantes
Alguns vigaristas declarados
A sessão foi uma luta
Que viu o pai da labuta
Perder para o colegiado.

23
No crime organizado
O rol da contravenção
Trinta e seis votos contados
Bastaram prá cassação
Estirpado o regente
Fica a vaga prá o suplente
Na roda viva da missão.

24
Na constituição e justiça
Quem falou sempre agredia
Com as palavras cortantes
Que como chicote ardia
Falou de reputação
Das cópias da gravação
Que no fundo comprometia.

25
No centro do parlatório
Os líderes falavam bem
E aquele bobo da corte
Se portava como refém
Pois as provas lá estavam
As imagens não negavam
Que ele estava ali também.

26
Foi mesmo um dia de cão
Do paladino da moral
Numa casa da República
Que parecía um tribunal
Naquele estranho instante
Vi a queda de um gigante
Lá no Senado Federal.

sábado, 31 de março de 2012